quinta-feira, janeiro 05, 2006

Palavra

Existe uma rivalidade inerente entre a palavra e o som.
A palavra quer ser escrita mas não quer ser declamada.
Ela quer a cobertura serena do silêncio, a solidão inconfessada da leitura clandestina.
A palavra é meretriz. Dá-se sem prazer pelo favor de ser escrita, de finalmente adquirir a forma orgástica da caligrafia.
A palavra é, sem dúvida, imoral.
A palavra fode-se a si mesma. Masturba-se eternamente enquanto aguarda a violação inevitável da caneta.
A palavra odeia-se.
Sabe-se à partida imortal e isso atira-a na angústia silenciosa da falta de amor. O tempo não ama a palavra. Não lhe concedeu, jamais, o doce sabor do fim.
O medo da morte.

A felicidade para o ser precisa dos limites do terror. Precisa saber que amanhã tudo poderá ser vazio.
A felicidade vive na necessidade do vazio.
Ansiosa.
A palavra não conhece felicidade.

A palavra não se conhece.
A palavra precisa da mão do Homem.
Vive subjugada às suas vontades.

Odeia-se.

A palavra vive na esperança do apogeu da palavra última, do ponto final.
Do fim.

1 comentário:

Anónimo disse...

"Feelings are intense, words are trivial...words are meaningless and forgettable..."